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Aos vinte e cinco dias do mês de janeiro de mil e quinhentos e noventa e dois anos nesta cidade do Salvador Bahia de Todos os Santos nas casas da morada do senhor visitador do Santo Ofício Heitor Furtado de Mendoça perante ele apareceu sem ser chamada Isabel da Fonseca e por querer denunciar coisas tocantes ao Santo Ofício, recebeu juramento dos santos evangelhos em que pos sua mão direita sob cargo do qual prometeu dizer verdade e disse que lhe parece que é cristã velha
natural
desta Bahia filha de Francisco de Morais e de sua mulher Catarina Fernandes casada com Gaspar Muniz lavrador morador em Tasuapina de idade de dezessete |
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anos, e denunciando disse que haverá sete, ou oito anos estando ela um dia à tarde à porta de Francisca Luís negra forra moradora nesta cidade viu a dita Francisca Luís dar a uma mulher que lhe ora não lembra quem era um recado para outra uma mulher cujo nome lhe não lembra a qual chamam a do veludo de alcunha mulher solteira e o recado dizia que a não agravasse e que o que houvesse mister que lho mandasse pedir que lho daria e não andasse com outrem, isto a modo de ciúmes e de então até agora sempre ela denunciante vê ser fama pública e geral que a dita Francisca Luís dorme carnalmente com a dita mulher solteira chamada a do veludo e que tem o dito ajuntamento nefando |
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com um instrumento coberto de veludo, e do costume disse nada e prometeu ter segredo e por não saber asssinar eu notário a seu rogo assinei com o senhor visitador Manoel Francisco notário do Santo Ofício nesta visitação o escrevi [*] Heitor Furtado de Mendonça ça [*] Manoel Francisco |
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Primeira sessão Francisca Luís Aos quatorze dias do mês de dezembro de mil e quinhentos e noventa e dois anos nesta cidade do Salvador Capitania da Bahia de Todos os Santos nas casas da morada do senhor visitador do Santo Ofício Heitor Furtado de Mendoça perante ele apareceu sendo chamada Francisca Luís mulher preta forra crioula da cidade do Porto casada com Domingos Soarez homem pardo remendão ausente do qual não tem novas se é vivo se morto vendedeira moradora nesta cidade, e logo foi amoestada com muita caridade pelo senhor visitador que ela declare e confesse nesta mesa todas suas culpas de toda sua vida pertencentes a ela e que fale a verdade porque isso lhe aproveitará muito para descargo |
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de sua consciência e para seu bom despacho, respondeu, que ela estando na cidade do Porto haverá quinze anos morou das portas adentro alguns dois meses com Maria Álvarez tecedeira mulher que em casa não tinha marido, e depois se foi para outras partes e se veio a esta Bahia na qual estando haverá treze anos ouviu dizer a Isabel Antônia que depois de ela ré vinda se diziam no Porto que ela ré que pecara com a dita tecedeira no pecado contra natura , porém que ela ré nesta mesa declara que nunca tal pecado cometeu com a dita tecedeira, e confessou que haverá treze anos pouco mais ou menos teve nesta cidade amizade com a dita Isabel Antônia mulher que não tem marido moradora nesta cidade |
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que dizem que veio do Porto degredada por usar o pecado nefando com outras mulheres e por ela ser sua natural ela ré agasalhou nesta cidade em sua casa um mês pouco mais ou menos no qual tempo pecou com ela o dito pecado nefando algumas três vezes, em diferentes dias pondo se uma em cima da outra e ajuntando seus corpos e vasos e isto sem haver mediante outro nenhum instrumento exterior penetrante e ela ré de si não se lembra se teve comprimento natural que as mulheres costumam nem sabe se o teve a dita cúmplice porém já por este caso elas ambas foram presas nesta cidade pelo juízo eclesiástico , e ela ré saiu condenada que se saísse fora daqui mas depois a deixaram ficar aqui e que isto só é o que |
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lhe lembra, perguntada que mulher é uma pela qual estando ela à sua porta mandou dizer à dita Isabel Antônia que ela a não agravasse e que lhe pedisse quanto houvese mister e que ela lho daria e que não andasse com outrem e isto a modo de ciúmes, respondeu ela ré que nunca tal recado mandou nem lhe lembra de tal, perguntada quantos anos há que ela mandou este recado, respondeu que não mandou tal recado, perguntada onde está ora esta portadora que foi deste recado, respondeu que tal recado não mandou, foi amoestada outra vez da parte de Deus nosso senhor que ela fale a verdade , respondeu, que não tem mais que dizer, e por não saber assinar eu notário a seu rogo assinei com o senhor visitador Manoel Francisco notário do Santo Ofício nesta visitação o escrevi Manoel Francisco Mendoça Heitor |
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Segunda sessão Aos quinze dias do mês de dezembro de mil e quinhentos e noventa e dois anos nesta cidade do Salvador Capitania da Bahia de Todos os Santos nas casas da morada do senhor visitador do Santo Ofício Heitor Furtado de Mendoça perante ele apareceu Francisca Luís ré conteúda nestes autos a qual recebeu juramento dos santos evangelhos em que pôs sua mão direita sob cargo do qual prometeu dizer em tudo verdade e foi logo tornada amoestar pelo senhor visitador com muita caridade que ela use de bom conselho e confesse toda a verdade respondeu que tem dito a verdade |
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e não tem mais que dizer e foi logo perguntada que resposta lhe mandou Isabel Antônia do recado, que ela ré lhe mandou que não conhecesse ela a outrem senão a ela que ela lhe daria o necessário, respondeu, que ela não mandou nunca tal recado, e perguntada genealo per sua genelosia disse que é de gia idade de quarenta anos segundo lhe parece pouco mais ou menos natural da cidade do Porto, filha de Diogo Luiz cativo que foi do chantre do Porto chamado [*] João de Ferrero não conheceu sua mãe tem uma meia irmã mulata filha de sua mãe negra e de um homem branco, forra no Porto, e perguntada pela doutrina |
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cristã benzeu-se e persignou-se, e disse o Padre Nosso, Ave Maria, e Credo, e não disse mais e disse que sabe ler pela cartilha e que pela cartilha lê o que há mister e por não saber assinar eu notário a seu rogo assinei com o senhor visitador Manoel Francisco notário do Santo Ofício nesta visitação o escrevi Manoel Francisco Mendoça Heitor Terceira sessão
Aos dezesseis dias do mês de dezembro de mil e quinhentos e noventa e dois anos nesta cidade do Salvador capitania da Bahia de Todos os Santos nas casas da morada do senhor visitador do Santo Ofício Heitor Furtado |
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de Mendoça perante ele apareceu sendo chamada Francisca Luís mulher preta ré conteúda nestes autos a qual recebeu juramento dos santos evangelhos sob cargo do qual prometeu dizer verdade e foi logo tornada amoestar com muita caridade que ela fale verdade porque lhe releva assim respondeu que é a verdade é como já tem dito que só três ou quatro vezes pecou como dito tem com a dita Isabel Antônia e depois disso foram ambas presas por este caso e ela ré saiu condenada que se saísse desta cidade e depois foi deixada ficar nela e que nunca mais nem antes nem depois em todo o tempo de sua vida que lhe lembra pecou |
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o tal pecado nefando nem com a dita cúmplice nem com outra pessoa alguma e perguntada quem são as pessoas que sabem que ela fez o dito pecado com a dita Isabel Antônia respondeu que não sabe disso, perguntada quantos dias [*] há que foi a derradeira vez que ela fez este pecado com a dita cúmplice ou com outrem, respondeu que há treze ou quatorze anos lhe aconteceu o que dito e que nunca mais fez o tal pecado e por não dizer mais foi lhe mandado ter segredo e assim o prometeu pelo juramento que recebeu e por não saber assinar a seu rogo assinei com o senhor visitador Manoel Francisco notário do Santo Ofício nesta visitação o escrevi
Mendoça Heitor Manoel Francisco |
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E feitas as ditas audiências e sessões logo pelo senhor visitador me foi mandado fazer estes autos conclusos os quais logo fiz Manoel Francisco notário do Santo Ofício nesta visitação o escrevi Conclusão Foram vistos estes autos em mesa e pareceu a todos os votos que vista a confissão da ré nas suas sessões de ter feito o nefando algumas três vezes com outra mulher e não teve castigo no juízo eclesiástico onde já foi acusada por este pecado, que pague dez cruzados para as despesas do Santo Ofício, e se lhe imponham penitências espirituais de confessar-se e jejuar etc. e pague as custas. Bahia, 8 agosto 1593.
Heitor Furtado de Mendoça [*] Fernão Jardim [*] Leonardo Armínio [*] Marcos da Costa [*] Frei Mancis da Cruz [*] Frei Damião Cordeiro [**] |