Tras[lad]o da C[onfissão] de Antônia de Barros, cristã-velha. Aos vinte e três dias do mês de agosto de mil e quinhentos e noventa e um anos, nesta cidade do Salvador, Bahia de Todos os Santos, nas casas da morada do senhor visitador do Santo Ofício, Heitor Furtado de Mendonça, perante ele apareceu sem ser chamada, dentro no tempo da graça, Antônia de Barros e, por querer confessar suas culpas, recebeu juramento dos Santos Evangelhos em que pôs sua mão direita sob cargo do qual prometeu dizer em tudo verdade. E disse ser cristã-velha natural de Benavente, de idade de se[t]enta anos, pouco mais ou menos, moradora nesta Bahia, mulher que foi de Álvaro Chaveiro, pescador e barqueiro de Benavente para Lisboa, filha de Diogo Rodrigues Perdigão, dos da governança da dita vila, e de sua mulher, Maria de Barros, defuntos. E, confessando, disse que haveria trinta e dois anos, pouco mais ou menos, que ela veio do Reino degredada pelas Justiças Seculares, por cinco anos para este Brasil, por adultério de que a acusou o dito seu marido. Ela, em Portugal, se amigou ela com um homem cristão-velho chamado Henrique Barbas, filho de Basco Barbas, da gente principal de vila Franca, e com ele se veio para este Brasil e aportaram na capitania. Poucos dias depois de estarem nela, sabendo ela muito bem e o dito Henrique Barbas de como o dito marido, Álvaro Chaveiro, seu legítimo marido ficava vivo em Portugal, se casaram ambos ela confessante com o dito Henrique Barbas. E o dito Henrique Barbas negociou testemunhas falsas que juraram que ele, Henrique Barbas, era solteiro, e que ela confessante era viúva e que viram enterrar e morrer em Benavente ao dito seu marido, Álvaro Chaveiro, sendo isto falsidade e mentira, porque depois de ela confessante estar casada com o dito Henrique Barbas, à porta da igreja, com licença do ordinário, por razão do dito instrumento de testemunhas falsas, depois disso, daí a dois anos, ainda estava vivo em Benavente o dito seu marido, Álvaro Chaveiro, e assim vieram depois novas e recados certos. E que, depois de assim se casar em face da igreja com o dito segundo marido, Henrique Barbas, sendo ela e ele sabedores que o seu legítimo marido, Álvaro Chaveiro, estava vivo, viveram ambos como casados em Porto Seguro mais de quinze anos. E, por ele vir a dar açoites e pancadas e muito má vida a ela confessante, lhe fugiu de casa e se meteu na igreja da vila e começou a declarar e manifestar como o dito Henrique Barbas não era seu marido legítimo, porquanto, quando com ele se casara no dito Porto Seguro era vivo ainda e depois vivera dois anos o seu marido legítimo, Álvaro Chaveiro, e, assim, se afastou dele, o qual ora está na capitania do Espírito Santo, costa deste Brasil, ainda solteiro, e, desta culpa, disse que pedia perdão e misericórdia nesta mesa dentro neste tempo da graça.